quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

O Cordel está vivo. E bem vivo.

Lembro do refrão de um samba que diz: "Não deixe o samba morrer..."

O apelo se devia à invasão da música internacional que sufocava como um rolo compressor, a produção tupiniquim. O período foi de certa forma breve e hoje a música brasileira é destaque no mundo inteiro.

Vejo arte e a música em particular como universal. A música é a boa independentemente de onde venha mas o bom e velho cordel vem mesmo é do nordeste brasileiro. Há, felizmente, pessoas atentas à sua sobrevivência como se lhes não saisse da cabeça o refrão do samba onde então samba seria cordel: "Não deixe o cordel morrer..."

Abaixo, um excelente cordel sugerido pelo amigo poeta, cordelista e zagueiro, Henrique Cesar Pinheiro:

De Heliodoro Morais, RN.

DIGA O QUE ANDA FAZENDO QUE EU DIGO QUEM VOCÊ É!

Tudo na vida é corrido
E cheio de confusão
Se torna muito difícil
Conhecer um cidadão
Por causa da correria
O nome bem que podia
Revelar a profissão

Quem vive no caminhão
Estrada afora a rodar
Trabalha de motorista
Sem tempo pra descansar
Pra ser identificado
Deveria ser chamado
Passos Dias Aguiar

Você pode trabalhar
Em algo que lhe seduz
Coveiro no cemitério
É um espírito de luz
Tem um nome adequado
Pra ele ser batizado
Armando Covas da Cruz

Lenhador também faz jus
A uma vida pacata
Apesar da profissão
Não oferecer mamata
Como derruba a floresta
Sua identidade é esta:
Décio Machado da Mata

Comandante de fragata
Tem a vida muito exposta
Não liga pro alto risco
Porque só faz o que gosta
Por viver no oceano
Tem um nome soberano
Lindomar Porto da Costa

No exército, a proposta
É de lutar só na terra
Onde o soldado é chamado
Rivaldo Campos de Guerra
Mas quando a luta é no ar
Ele passa a se chamar
Eduardo Céu da Serra

Amâncio Leão encerra
O nome do domador
Que entra no picadeiro
Pra demonstrar seu valor
E Da Luz do Nascimento
Obstetra e instrumento
Da força do criador

Pecuarista e agricultor
Tem Jack Castro Cordeiro
Thomas Leite de Bezerra
Delgado Dácio Carneiro
Lauri Tadeu Oscar Brito
São um exemplo bonito
De nomes de fazendeiro

O nosso herói, o vaqueiro
Tem no nome o seu espelho
Edgar Lopes Mourão
Cabra do sangue vermelho
O caçador destemido
Tem o nome conhecido
Alzair Cássio Coelho

Diretora do conselho
Da defesa ambiental
Rosa Amélia Jardim Flores
Com seu guarda florestal
Silvestre Ramos Pinheiro
São exemplo verdadeiro
De um grande profissional

Dentro do reino animal
Com base na profissão
Qualquer nome que se diga
É de fácil dedução
Seguindo nesse cenário
Quem é o veterinário?
Jussara Aranha Leitão

Coitado do cidadão
Miserável, proletário
Pela pobreza do nome
Eliseu Elisiário
O outro extremo é legal
Érico Nobre Real
É nome milionário

Mas um simples operário
Que corre atrás do dinheiro
Pode ser uma mulher
No ofício de pedreiro
Por mais que seja bizarro
Magali Melo de Barros
É seu nome verdadeiro

Ele é o grande guerreiro
O pregador dos encantos
Prega a palavra de Deus
Orando nos quatro cantos
Recebendo como dote
Seu nome de sacerdote
Inácio Bento dos Santos

Quando a mulher, no entanto
Segue o rumo do pecado
Vendendo o corpo e a alma
Por uns míseros trocados
No nome está sua sede
Eva Gina das Mercedes
Doida por carro importado

Se um sujeito cansado
Segue o seu caminho vago
Sozinho numa canoa
Sem receber um afago
Levando a isca e a vara
O seu nome está na cara
É Remo Geraldo Lago

Ela que assume o estrago
Já que sua filha Elisa
Corre pra porta do Banco
Quando de grana precisa
Pela sua assinatura
Quem é que paga a fatura?
A sua mãe Ava Lisa

Alguém que gosta de brisa
Ama o sol da alvorada
O orvalho da manhã
O canto da passarada
O seu nome quer qu'eu fale?
Aurora Clara do Vale
A mulher da madrugada

Uma mulher mal amada
Traz a frieza na fronte
A dureza de uma pedra
O suspense de uma ponte
Eu sei dizer quem é ela
Só pela postura dela
Pietra Rocha do Monte

Na linha do horizonte
Tem uma obra bonita
Que se destaca no céu
Como uma coisa infinita
É uma igreja enorme
Que foi erguida conforme
Alcino Torres Mesquita

O advogado jurista
Que mata a gente de susto
De tanto criar imposto
Vai se chamar Noé Justo
Ou então Severo Carrasco
Que quando faz um churrasco
O povo é quem paga o custo

Hoje eu já não me assusto
Com a postura indecente
Do nosso representante
Que só quer roubar a gente
Seu nome vem do cinismo
Da prática do nepotismo
Alceu Augusto Parente

Tem uns nomes diferentes
Faty Mamede Borrego
Henfil Madeira Correia
Jacinto Aquino Rego
Jô Amadeu Leite Secco
Patty Faria no beco
Mas nada que dê sossego

Em cada caso o emprego
Que seja mais adequado
Pro cozinheiro: Agostinho
Edi Pimenta Salgado
Tem muito nome distinto
Por exemplo, Caio Pinto
É nome de aposentado...

2 comentários:

  1. estou pesquisando sobre cordel para um trabalho na Universidade, gostaria de informacoes e curiosidades sobre o Cordel. Muito obrigada!
    Sandra

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  2. Olá Sandra.

    Sugiro - se é que você já não o leu - a leitura do livro "Zé Limeira - O Poeta do Absurdo" do poeta e jornalista paraibano de Campina Grande, Orlando Tejo.

    Curiosidade: Há quem diga que o Zé e o Orlando são a mesma pessoa.

    Um abraço,

    Alberto de Oliveira.

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