Veja abaixo matéria publicada no Jornal O Globo em 11/10/2009:
Morto precocemente em 1982, pianista cearense Jacques Klein é lembrado em concurso
Imagine um excelente pianista, do tipo que é referência mundial, tocando com as maiores orquestras do planeta. Dê a ele bom humor, gênio impulsivo e, de quebra, um talento especial para se comunicar com plateias das mais esnobes às mais simplórias. Hoje pode ser difícil imaginar, mas o produto dessa mistura existiu, sim, veio de Aracati, no Ceará, e se chamava Jacques Klein.
Consumido por um câncer quando ainda estava no auge da carreira, aos 52 anos, Klein era um tipo raro de músico clássico. Era popular. Amava interpretar Beethoven, Mozart e Chopin. Mas também compôs com Dorival Caymmi, teve um grupo de jazz e aparecia com tanta naturalidade na TV que chegava a dar autógrafo na rua.
Morreu em 1982, mas parece que foi há séculos. Deixou quase nada gravado, e, saindo do circuito da música clássica, seu nome é pouco conhecido entre os mais jovens. Daí que ele foi escolhido para ser o homenageado do primeiro Concurso Internacional BNDES de Piano, que acontece esta semana, na Sala Cecília Meireles, reunindo 20 jovens pianistas brasileiros e estrangeiros, pré-selecionados entre 34 inscritos. Há mais de 50 anos não havia concurso dessas proporções por aqui.
Um pouco mais sobre Jacques Klein:
Texto de Luis Reis (revisado por Alberto de Oliveira).
Nasceu em Aracati - Ce, no dia 10 de julho de 1930, filho de Alberto Jacques Klein, comerciante, e Gasparina Campello Klein.
Faleceu em 23 de outubro de 1982, aos 52 anos, vítima de câncer, no Rio de Janeiro.
Sua vocação musical se manifestou muito cedo.
Era um garoto dotado de um esplêndido "ouvido musical", destacando-se nas aulas de música e mostrando um apurado gosto nessa área.
Até os 18 anos, Jacques dedicou-se ao estudo do jazz, tendo inclusive feito algumas gravações desse estilo musical em disco de 78 rpm.
No ano de 1949, foi para os Estados unidos com a firme intenção de estudar música clássica. O seu primeiro contato profissional aconteceu com o legendário músico norte americano Art Tatum, que, impressionado ao vê-lo tocar jazz em Nova Yorque, fez-lhe o convite para tocar como profissional em sua banda. Jacques manteve-se firme na sua decisão de estudar clássico e não aceitou o convite do músico famoso. Antes, ainda no Brasil, chegou a prestar exame vestibular para Direito, na PUC, obtendo o 5° lugar, mas optou por seguir os caminhos da música, atraído pelos maviosos acordes do piano. Durante um certo tempo, alimentou a idéia de se dedicar à diplomacia, carreira que encantava a família, mas seus rápidos progressos no estudo musical o fizeram desistir dessa idéia. Seu grande momento internacional aconteceu em 1953, em Genebra, na Suiça, quando conquistou, com méritos, o 1° lugar no Concurso Internacional para Pianistas. Na época, era esse o mais importante concurso em todo o mundo e, depois de muitos anos, um pianista veio a conquistar o primeiro luar na competição. Nos anos anteriores, não havia sido conferido o primeiro lugar a nenhum concorrente. O melhor ficava com a 2a colocação, de acordo com o julgamento dos juízes do concurso. A partir dessa conquista, sua carreira na Europa tomou rumos de grande sucesso. Era um pianista admirado em todo o velho Continente e, em Viena, na Áustria, terra de grandes músicos, Jacques Klein chegou a ser comparado a Horowitz e Rubinstein, na época, os grandes nomes da música clássica. Suas apresentações eram concorridíssimas, grande público se aglomerava à porta das casas onde se apresentava na Europa e rendia homenagens ao músico aracatiense e inúmeras foram as condecorações a ele conferidas. O Governo inglês, por exemplo, outorgou-lhe a medalha Harriet Cohen, uma das maiores comendas daquele país. Quando de sua estréia nos Estados unidos, em 1959, a crítica o considerou como um dos maiores pianistas "não só de sua geração, mas também da geração que o precedeu. Na ocasião, Jacques Klein foi considerado superior a Emil Gilels e Van Cliburn, este último um ídolo americano porque vencera o concurso de Moscou. Jacques Klein foi solista das mais importantes orquestras mundiais e realizou importantes ciclos de concertos, como o das 32 sonatas para piano de Beethoven. Durante alguns anos, participou da direção da Orquestra Sinfônica Brasileira e ocupou o cargo de Diretor da Sala Cecília Meireles, no Rio de Janeiro, onde realizou uma administração exemplar. Foi também excelente músico de câmara, tendo tocado inúmeras vezes no Brasil e na Europa com o grande violonista italiano Salvatore Accardo. Jacques Klein destacou-se ainda como professor, dando enorme contribuição para a formação de famosos pianistas, como Nelson Freire, Arnaldo Cohen, Luiz Fernando Benedini, José Henrique, Edson Elias, Sônia Goulart e João Carlos Assis Brasil, entre tantos outros. Em seus últimos anos de vida, incansável e sempre otimista, alternava períodos de internação hospitalar com sérios concertos e recitais. Um mês antes de sua morte, ainda reuniu forças para ser solista, no Rio de Janeiro, da Orquestra de Câmara de Moscou. O maior nome da expressão musical pianística clássica brasileira na Europa.
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